*Rubens Francisco Lucchetti em entrevista à encantadora Jerusa Pires Ferreira (Rubens Francisco Lucchetti - o homem de 1000 livros. São Paulo: COM-ARTE, 2008)
Ocorre que escolhi esta frase para iniciar um breve ensaio sobre o encontro entre Jorge Melícias, Ana Paula Maia e Fernando Segolin no Seminário Literatura e Violência. No discurso de Melícias sobre o grotesco e posteriormente na fala de Ana Paula Maia, um aspecto curioso me chamou a atenção: a evocação do tema O Estranho do Freud. Prefiro a palavra no sentido original: unheimlich, pois amplia as possibilidades de análise. A princípio se falou do grotesco, entretanto, chegar ao conceito do horror foi inevitável.
Freud já analisou o tema do estranho, unheimlich, inquestionavelmente associado ao que é assustador, que provoca medo e horror, no texto Das Unheimliche (O Estranho). Neste, em um primeiro momento, é realizado um estudo etimológico da palavra alemã, porquanto a complexidade de sua estrutura, uma vez que abriga o vocábulo “casa” (Heim) em sua raiz. Por intermédio de vários e diferentes significados, o autor nos mostra que em algum momento a palavra unheimlich, estranho, tem o mesmo sentido que seu contrário, ou seja, heimlich, familiar. Por conseguinte, conclui, à luz da sentença de Schelling, “unheimlich é o nome de tudo que deveria ter permanecido ... secreto e oculto mas veio à luz”, que unheimlich (o estranho) é de um modo ou de outro uma subespécie de heimlich (familiar).
Oscar Cesarotto explora o estranho (unheimlich) como aquilo que, familiar e íntimo, estava apagado e é reativado por um fato extrínseco, para ser projetado como alheio. Segundo ele, o efeito concomitante é “a sensação sinistra que se produz ao se esfacelar a realidade, porque nessa hora, qualquer resguardo revela-se insuficiente.”
Ao que me remeto ao interessante comentário tecido por Stephen Dedalus, o artista jovem de James Joyce, sobre o terror, um dos sentimentos catárticos da Arte Poética de Aristóteles: “o terror é o sentimento que detém o espírito na presença de seja lá o que for que seja grave e constante no sofrimento humano e o liga à sua causa secreta.” Daí concluo que o horror ao real de Lucchetti é também uma catarse.
Posto isto, retomo uma das questões levantadas pela platéia sobre a diferença entre a violência dita "banalizada" e a violência discutida e presente nos textos dos dois escritores. Conheço o trabalho de Ana Paula Maia, do qual gosto muito, e posso afirmar seguramente que diferentemente da violência (não diria "banalizada") artificial, estereotipada, a violência presente nos textos da escritora suscita o terror catártico descrito por Dedalus, e me liga a minha causa secreta, ao que me é tão estranho e ao mesmo tempo tão familiar.
PS: 1) Pra variar, fiquei vermelho-escuro quando Ana Paula Maia falou do meu e-mail, mas não deixei de sorrir, e me acusei: fui eu a danada!
2) creio que unheimlich é um adjetivo, por isso mantive em letra minúscula, se estiver errada sintam-se à vontade em me corrigir
2 comentários:
Oi, Vé, querida! Você participou do seminário "literatura e violência"? Meu orientador, Francisco Foot Hardman, e meu professor, Marcio Seligman, fazem parte de um grupo de pesquisa chamado "Escritas da Violência", e me parece que estariam presentes nesse encontro, não tenho certeza. Eu queria ter ido, mas esse final de semestre tem sido cruel...
Beijos, Vé!
Andrea, querida! Vacilo meu, também, não tê-la avisado do evento. Desculpe-me por não chamá-la, mas é que, pra variar, ando com a cabeça na LUA (de Clarice, claro!). Final de ano é terrível mesmo, cruel. Tenho que terminar o primeiro capítulo da minha tese até dezembro, ai,ai. Mas nossa cerveja ainda está de pé, não? (inda mais agora, com o dinheiro da bolsa!)
Beijos e saudades
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