"Querida, você tem um coração na garganta"
Minha avó

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Telefone Sem Fio - Lançamento




Aos meus cinco leitores: os convido para o lançamento do meu romance Telefone Sem Fio, pela Editora Patuá. Será no significativo dia 23 de abril , no Hussardos Clube Literário, a partir das 19h30.

Capa: Leonardo Mathias.

Um trecho:

Uma pausa, silencioso leitor. Pois que eis um pouco de mim aqui neste posto de gasolina. Desses onde nunca nos é suficiente seu combustível, a viagem sempre é maior.  O banheiro, meu refúgio de Carlos.  Contraio as pernas, minto que estou apertada e pra lá me direciono. Não consigo erguer meus olhos, como se o piso molhado deste posto fosse a única saída. O cheiro forte de gasolina quase me derruba, somos auto-inflamáveis. Acho que estou desaprendendo a andar. Um pé depois do outro, não é assim que nos ensinam, percorrer o solo pé ante pé? Vamos lá, Alma, você consegue. A placa caída com um W apagado indica a porta do meu esconderijo. Entro de cabeça baixa. Respiro o lugar imundo de vestígios dos outros. Não há papel higiênico, apenas, no chão, seus pedaços. Também não há espelho, posso imaginar meu reflexo na água suja sob meus pés. Quantas pessoas já passaram por aqui, quantos reflexos guardam a água suja? Puxo a cordinha da descarga sem qualquer necessidade, com o único intuito de fingir um alívio que não sinto. Abandono meu pequeno jazigo, enquanto piso em uma sombra alongada. A voz transborda o corpo. Dissimulo um olhar distante, afasto meus olhos do espaço que ocupa. Em vão, a dona da sombra alongada se aproxima. “A chave do banheiro”, ordena. Faço-me surda. “Colega”, quase cospe, “a chave”, balança o corpo e a sombra, “preciso da chave”, grasna. “Não tem chave”, finalizo. “Você? Tá bem?”, ela insiste em mim. Apenas movimento a cabeça em um nãosimnãosimsim. “A mulher tá chorando!”, “a mulher” sou eu, difícil e impaciente. Não quero me lembrar de hoje, pode ser? Carlos percebe e nos socorre. “Alma?”, se esconde em mim. “Tudo bem?”. Chão, Alma, olhe pro chão, ela pode virar pedra. “Sua mulher tá chorando”, conclusão brilhante. “Sim”, ele enxuga a testa e continua “estamos passando por um momento difícil. Seu irmão.” Carlos tem uma incrível facilidade em desperdiçar seus momentos mais doídos com estranhos, na beira de estradas. Aponta pra alguma direção que não se vê e apenas diz “Enterro”.  Por fim, envolve-me sobre seu corpo, e nada mais a ser dito. Vamos os dois pro carro, indevidamente abastecidos. A sombra se alonga ainda mais pelo sol baixo e tragédia nossa. Encolho-me sobre o meu caderninho.  

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom seus textos; é a primeira vez que visito seu blog.
Queira uma dica: A cor preta de fundo atrapalha tanto minha leitura!

Abraços

Vera Helena disse...

Anônimo, bem-vindo, agradeço a visita e o comentário. Sabe que já estava pensando em mudar o layout do blog há algum tempo? Eu mantenho o mesmo desde 2007
Volte mais vezes, e me diga se a leitura está melhor.

Beijo grande,

Vera Helelna